Ao que tudo indica, o acobertamento pela grande mídia de escândalos “amigos” pode ter ultrapassado aquela barreira que, seja quem for que ultrapasse, obriga as instituições corrompidas deste país a ao menos darem uma satisfação à sociedade.
Como se sabe, escândalos políticos como o que envolve a compra de trens de metrô da alemã Siemens pelos governadores Mario Covas, Geraldo Alckmin e José Serra – escândalo cujos indícios surgiram há anos no caso Alstom, que não foi investigado corretamente no Brasil – nunca dão em nada se a grande imprensa não se interessa por eles.
O escândalo PSDB-SP/Siemens, por exemplo, é muito mais grave do que o do mensalão do PT, pois quem se corrompeu ao longo de duas décadas de governos tucanos em São Paulo não o fez com o fim “institucional” de comprar apoio político, mas para auferir enriquecimento pessoal.
E a soma envolvida é muito maior – 400 milhões de reais.
Apesar disso, os veículos que lideraram uma das maiores coberturas jornalísticas da história mundial sobre um escândalo político – cobertura que rivaliza com a do escândalo norte-americano Watergate -, a do escândalo do mensalão, até o momento se recusam a noticiar um caso que pode – apenas pode – sair do controle dos moralistas de Globos, Folhas, Vejas e Estadões.
Até o momento, entre os grandes grupos de mídia supracitados – os únicos que conseguem fazer escândalos “andar” – não se disse praticamente nada. Nenhum colunista indignado, nenhum editorial demolidor e insultante aos envolvidos.
O tom dos poucos, ou melhor, dos raríssimos textos nessa mídia – na falta de uma só matéria na Globo – sobre escândalo dessa monta envolvendo o sacrossanto PSDB paulista, chega a ser compungido.
Um colunista da Veja tocou no assunto. O tom do texto contrasta escandalosamente com os que a mesma figura escrevia sobre o mensalão do PT. Veja, abaixo, post do colunista da revista Veja Ricardo Setti
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Do Blog de Ricardo Setti no portal da Veja
Geraldo Alckmin
30/07/2013 às 20:28 \ Política & Cia
Denúncias sobre supostas roubalheiras no metrô e trens de SP devem ser investigadas a fundo — tanto para colocar na cadeia os culpados como para não permitir o linchamento dos inocentes
A Folha de S. Paulo informou que a multinacional alemã Siemens admitiu devolver aos cofres do Estado de São Paulo “parte do valor” que teria sido superfaturado no fornecimento de equipamentos de trens e metrô paulistas, durante uma reunião de executivos da empresa com promotores do Ministério Público estadual, na semana passada.
A Siemens, como se sabe, informou ao Conselho de Defesa Econômica do Ministério da Justiça (CADE) — órgão que tem como missão propiciar a livre concorrência entre empresas e barrar a formação de trustes –, sua própria participação num cartel formado para obter vantagens ilícitas em licitações para compra de equipamento ferroviário e para a construção e a manutenção de linhas de trens e metrô em São Paulo e também no Distrito Federal.
O esquema de maracutaias, que podem haver inflado preços em até 20% dos níveis de mercado, teria acontecido entre 1995 e 2003, período em o Estado foi governado pelos tucanos Mário Covas e Geraldo Alckmin.
Além da Siemens, a malandragem envolveria também subsidiárias das multinacionais Bombardier (canadense), Alstom (francesa), Mitsui (japonesa) e CAF (espanhola), e as empresas nacionais Serveng-Civilsan, Tejofran, TTrans, MGE, TCBR, Temoinsa e Iesa.
Acho interessante que a Siemens se proponha a devolver “parte” de um dinheiro que, ela própria admite, embolsou ilegalmente. O que conheço em matéria de trocar informação sobre crime por benefícios é a delação premiada — mas ela vale para as pessoas que, ajudando a polícia a investigar, obtêm do Ministério Público e da Justiça a vantagem de diminuição de pena.
De todo modo, a Siemens anunciou que “coopera integralmente com as autoridades”, postura mantida pelas demais empresas.
O governador Geraldo Alckmin, de sua parte, afirmou que os fatos serão investigados “rigorosamente”.
E é absolutamente necessário que sejam. Se houve roubalheira, como parece ser o caso, é preciso que a polícia e o Ministério Público ajam com rigor e rapidez, para descobrir como, quando, e, sobretudo, quem.
Quem tem culpa no cartório?
Secretários ou ex-secretários de Estado?
Os presidentes ou ex-presidentes do Metrô ou da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos?
Ex ou atuais diretores de ambas as estatais?
Covas?
Alckmin?
Os dois?
A ação é importante, adicionalmente, porque, enquanto flutuar no ar a acusação genérica de que houve ladroagem nos governos de Covas e de Alckmin — que podem perfeitamente estar inocentes de tudo isso –, somente os nomes de ambos estará na berlinda.
Covas, morto em 2001, foi um político de integridade indiscutível. Alckmin nunca teve contra si alegações de desonestidade pessoal. Até prova em contrário, são inocentes, até porque a Constituição assim prevê e garante.
Quanto mais as investigações sobre os culpados demorarem, mais serão linchados moralmente.
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É muita cara-de-pau. Desde quando as trajetórias ilibadas de José Dirceu ou de Lula impediram “linchamentos” e “ilações” contra eles pelo patrão desse sujeito aí em cima, quando eclodiu o escândalo do mensalão?
Lula, que até hoje nunca teve uma só mácula contra si, é tratado por esse Setti e por seus pares como um bandido. Dirceu, que jamais se envolvera em escândalo nenhum até ser acusado em 2005, desde o primeiro momento foi tratado pela Veja e Cia. como culpado.
Mas o pior é que o textinho de Setti ainda acoberta Serra, que integra o seleto grupo de governadores de São Paulo que, nos últimos vinte anos, conviveram com a roubalheira desabrida no governo do Estado e que, tanto quanto José Dirceu, terão que ser cobrados pelo “domínio do fato”.
Mas Setti esqueceu o “domínio do fato”; contra tucanos, pede provas enquanto brada “Linchamento! Linchamento!”.
No entanto, ao tocar no assunto o colunista da Veja mostra que vai ficando difícil escondê-lo. A Siemens confessou o suborno aos governos do PSDB paulista ao longo de duas décadas e não dá mais para deixar de perguntar por que o “domínio do fato” pode ser usado contra o PT, mas não pode ser usado contra o PSDB.
Se José Dirceu, mesmo afastado do PT, foi responsabilizado pelo que ocorreu no âmbito do partido, por certo que Covas, Alckmin e Serra têm que responder pelo que ocorreu no governo deles mesmos e que ignoraram apesar de as acusações à Alstom e à Siemens serem notórias.
Esses governadores de São Paulo, note-se, não determinaram nenhuma investigação. Varreram tudo para debaixo do tapete. No mínimo, prevaricaram.
O escândalo envolve atividades da Siemens em várias partes do mundo e já ganhou projeção internacional. A coisa está tomando uma dimensão tal que o jornal Folha de São Paulo, que até aqui escondeu o assunto, publicou, nesta quinta-feira (1.8), carta de leitor que cobra a mídia pelo ocultamento desse terremoto político que vai se desenhando.
do Blog da Cidadania
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