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sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

“Apaguinho” foi, sim, defeito. Mas a crise da água é um monstro que não se pode esconder

Autor: Fernando Brito
chuvassaofrancisco
É mais que imbecil, é primariamente idiota o enfoque dado por parte da mídia ao “apaguinho” sentido ontem em diversas regiões do país.
Qualquer um que estivesse no Rio ou em São Paulo é capaz de imaginar o aumento de consumo.
Atrasei este post até ter dados do aumento de consumo no Sudeste transformado em fornalha: foi o maior consumo da história no Sudeste e no Nordeste.
Mas não foi isso o que fez a luz cair por alguns minutos.
Foi uma situação que qualquer um que tenha fusíveis em casa sabe: se uma das “fases” tem problemas e tudo é ligado nas outras, o sistema entraria em sobrecarga e, portanto, seria necessário, para evitar um curto-circuito, desligar alguns aparelhos, até normalizar-se a situação.
Tanto que ocorreu, como já se apurou, depois do momento de maior consumo. Foi, portanto, a soma de alto consumo com um defeito técnico que sobrecarregou linhas que, sem ele, suportaram a carga.
Pode acontecer em qualquer verão senegalesco, como este.
Não está aí o problema do sistema elétrico brasileiro.
Está na falta de chuva somada aos atrasos nas obras de geração e transmissão de energia.
Quanto à chuva, tirando os apelos ao pessoal da Fundação Cobra Coral, nada se pode fazer.
Mas é preciso deixar de ser hipócrita com a questão da geração elétrica.
Belo Monte, mesmo tendo sido reduzida a um terço de sua capacidade de geração contínua,  tem um atraso superior a um ano por conta de demandas judiciais com razões ambientais.
Ontem, a Folha noticiou a suspensão da obra da usina de São Manoel por decisão judicial porque, embora não atinja diretamente populações indígenas, inunda áreas de valor espiritual para aquelas comunidades. É a quinta suspensão da obra, por decisões demoradamente revogadas. Já a Usina de Teles Pires, depois de muitas idas e vindas, está gerando energia, mas não a transmite ao país, porque as linhas que a levariam estão enfrentando problemas de autorização ambiental em certos trechos.
Todas as razões, em geral, são plausíveis e ninguém discute que os direitos indígenas e a preservação ambiental devem ser considerados todo o tempo.
Resta saber se a sociedade está sendo informada de que não se faz usina para gerar eletricidade sem algum dano e se estamos, ao menos em parte, dispostos a renunciar a sermos uma sociedade de alto nível de consumo elétrico.
Se esta discussão ficar restrita à elite e ás ONGs (tanto as de boas quanto as de pouco confessáveis intenções) vamos permanecer neste impasse: nem se fazem as obras, nem se corrigem hábitos e vamos continuar achando que energia é algo que existe só a partir do interruptor.
A praça diante de minha casa, que nunca havia deixado de ser verde, nos últimos oito anos, ficou totalmente ressecada em 2014. Agora, não está ressecada, está morta.
Muitas pessoas vêem  que estamos vivendo uma grande seca mas outras, onde caem chuvas torrenciais que não drenam para os reservatórios não fazem noção da gravidade da situação.
Um dezembro pouco abaixo do normal e um janeiro desastroso em matéria de chuvas no Sudeste levaram ao limite da prudência a situação dos reservatórios.
Das bacias do Sudeste e do Nordeste a que mais teve chuvas foi aquela que todos pensam estar sendo mais castigada, a do Tietê, onde choveu 28% da média de janeiro.
Foi, ao contrário, a que mais teve chuva.
Outras bacias importantes, como a do São Francisco, tiveram só 5% das chuvas médias de janeiro e a do Paraíba do Sul, meros 15%.
Tanto quanto não se deve criar alarmismo sem razão de ser, porque não há risco de colapso de geração a curtíssimo prazo e não foi isso que provocou os problemas de ontem, também não se pode repetir o procedimento de Geraldo Alckmin, dizendo que não havia risco algum.
O governo precisa, e já, iniciar uma campanha pedindo a economia possível de energia, para evitar  que se viva a situação desesperadora e quase que irreversível que se vive em São Paulo.
E deve lança-la publicamente, pedindo que os veículos de comunicação a veiculem gratuitamente ou por preço simbólico, como devem fazer – ou deveriam – em campanhas de urgente interesse social.
Todos os meios de comunicação, até para que se evidencie quem merece ser chamado de órgão de comunicação social.
PS. Dito isto, porque aqui a gente tem o péssimo hábito de tratar disso com seriedade, ainda hoje, sem trocadilho, dissecar a situação do abastecimento de água em São Paulo.

do Blog Tijolaço

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